‘Palhaceata’ pelas ruas

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Foto: Marcelo Meniquelli

Quando saiu de sua casa em Palhoça, cidade ao lado de Florianópolis, usando um chinelo de dedo; Thiago Santos, 13 anos, não esperava encontrar o fantástico. Escoltado pelos dois irmãos mais novos: Ivonei, 12, e Alexandro, 8; o garoto tinha a ideia de passar a tarde brincando pelas ruas do Centro da Capital. No meio do caminho, viu dezenas de palhaços invadindo o seu espaço. Eram os artistas do Anjos do Picadeiro 8 — Encontro Internacional de Palhaços em frenesi durante a Palhaceata, desfile de abertura do encontro. Não deu outra: o trio resolveu segui-los.

A concentração de aproximadamente 100 clowns aconteceu na Praça Pereira Oliveira, na última quarta-feira. Os clowns oriundos de diversas partes do Brasil e do mundo foram recepcionados por uma chuva fininha, sinal de que São Pedro estaria disposto a lavar o céu mas, por intermédio de São Genésio, o santo palhaço, resolveu adiar a limpeza. Abel e Lily do Seres de Luz de Teatro de Barão Geraldo chegaram bem cedo ao local combinado. Em poucos instantes, questão dela colocar o nariz vermelho, o duo transformou-se em Tanguito e Jasmim. Logo depois, outras figuras conhecidas dos campineiros aportaram na praça. Espaguete vinha de faxineiro, Zabobrim de padre e Felisberto de soldado.

De fora da cena, os três meninos se deliciavam. A presença de clowns na ilha não é tão comum. “Já pensei em ser palhaço, sabia?”, revelou Thiago, o mais falante. Os dois mais novos eram o silêncio em forma de guri. De repente, os irmãos foram surpreendidos por um polvo gigante feito a partir de balões vermelhos, obra o clown Tomate; e por um bicho estranho: bernunça (ser inspirado no dragão chinês, muito comum nas festas do Boi-de-Mamão em Floripa) que se impuseram diante dos clowns. O trabalho do último, feito a partir de materiais recicláveis, foi produzido pelo artista plástico da cidade Valdir Agostinho.

panorama32Ao som de uma bandinha, daquelas encontradas nos circos de ontem, os palhaços reviveram marchinhas de Carnaval e canções infantis. Parecia até um bordão carnavalesco fora de época. Em frente à Secretaria da Fazenda, os meninos de Palhoça assistiram a uma performance artística, mas não entenderam nada. Traduzindo: se tratava de uma reivindicação, protagonizada pelo mímico Álvaro Assad, assumindo a figura de Deus, e padre palhaço; sobre uma portaria da Prefeitura, em vigor desde junho, que proíbe os artistas de trabalharem nos semáforos. “O Anjos aproveitou para simular a entrega de uma carta gigante ao poder público, pedindo novamente a liberação do espaço; e também uma a Deus para intervir por nós”, explica Assad.

No Largo da Alfândega, após quase uma hora de cortejo, em que palhaços interagiam com os passantes; a Palhaceata chegou ao seu fim. No lugar, uma grande roda foi aberta. Dentro dela, os presentes acompanharam a uma guerra de clowns. Só que as bombas eram de bexigas d’água e os mísseis produzidos de jornal com farinha. Após o combate, cujas trincheiras foram improvisadas através de guarda-chuvas; os guerreiros, sujos e arrependidos, fizeram as pazes.

Na dispersão dos clowns, Thiago e seus irmãos tentavam aproveitar os resíduos da Guerra Mundial dos Palhaços para brincar. Fizeram a farra, junto a outros meninos. Naquele instante, percebia-se nos olhos daquele trio, que no começo da Palhaceata estampavam algo do tipo: “Ei seo palhaço, lá em casa não tem marmelada, nem goiabada, nem palhaçada.” Atiradinhos como eles só, já estavam com os respectivos narizes pintados de tinta. Ao ver Thiago tomar três bolinhas nas mãos, andar brincalhão e fazer malabares; uma certeza ficou. Nasceu mais um palhaço!

O Reporter Viajou a convite da organização do evento

Campinas é cotada para sediar evento

panorama30Palhaço também sonha. E alto, por sinal. Tratando-se das quimeras dos clowns radicados em Campinas, com participações tão expressivas ao longo dos oito anos de Anjos de Picadeiro (a edição de 2009 termina hoje); uma delas é unânime e pertinente: abrigar uma edição da clownferência na cidade. Potencial artístico, Campinas tem de sobra, principalmente quando o assunto é palhaços. “Somos bem representados. Nossa pesquisa tem sido referência para muitos grupos e pessoas espalhados pelo Brasil”, destaca o clown Ésio Magalhães. João Carlos Artigos, o diretor geral do Anjos, vê com bons olhos Campinas como sede de um próximo encontro. “A cidade tem tudo para receber o Anjos: público e ótimos artistas”, destaca o intérprete do palhaço Seo Flô. Se um dia o sonho viesse a tomar corpo de realidade, o território das palhaçadas estaria escolhido: Barão Geraldo. “É o principado da arte teatral de Campinas.” No entanto, não basta sonhar. O apoio do poder público é de extrema necessidade. Em média, um encontro como esse não sai por menos de R$ 500 mil reais. (TG/AAN)


Publicado in Correio Pupolar – Caderno C – pg 08 – Dezembro/2009.


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