Um espaço para o Circo Paulistano

O ano de 2010 promete ser um bom ano para os circenses da Cidade de São Paulo, um ano com muitas coisas importantes acontecendo. É ano de Cirque du Soleil (com o espetáculo Quidam, em cartaz no Parque Villa Lobos, com 5 brasileiros no elenco!). É ano de eleição, e ano de eleição sempre tem trabalho para os circenses. E promessas, espero que para o circo também. É o ano da mudança do CEFAC para o Tendal da Lapa (importante para mim e, espero, para uma boa parcela da comunidade circense). É o ano do lançamento da Praça das Artes, que terá, também, uma Escola Superior de Circo gerenciada pela Secretaria Municipal de Cultura. É o ano de início de funcionamento da Escola São Paulo de Teatro, que vai formar, gratuitamente, técnicos em espetáculclusive os, diretores e cômicos, entre outros profissionais. E é o ano para o qual a Secretaria de Estado da Cultura prometeu abrir a Escola Profissionalizante de Circo (ainda não foi anunciado o nome oficial, este eu que inventei). E isso é muito importante. De repente, a cidade que já teve a primeira escola de circo do Brasil (a Academia Piolim, de 1979), a primeira escola particular do Brasil (o Circo Escola Picadeiro, de 1984) e é, até hoje, o local de maior atividade circense de qualquer tipo no Brasil, de repente São Paulo tem a perspectiva de ter, a curto ou médio prazo, duas novas escolas, de grande porte e de grande importância. Explico:

No final do ano passado, 2009, foram anunciados, quase que simultaneamente (talvez efeito da proximidade das eleições?) a criação das duas escolas públicas em São Paulo. A escola municipal apresentou apenas o seu projeto arquitetônico, um projeto impressionante, com até 35m de altura na cúpula principal da lona que será instalada no Largo Paissandu (ponto histórico para o Circo paulistano) e promete ser um curso superior, com lançamento para 2012, a princípio. Não sei muito mais do que isso, porque ainda não há definições a respeito. A escola está em fase de planejamento e negociação política, me parece. Mas o terreno já está desapropriado e reservado, e o projeto arquitetônico, pronto.

A escola estadual está mais próxima: Deve ser inaugurada no segundo semestre de 2010, no Parque Estadual do Belém (área famosa da antiga Febem), na zona Leste de São Paulo. Esta está ligada ao Projeto Fábricas de Cultura, financiado pelo BID – Banco Internacional de Desenvolvimento, e será para jovens de baixa renda, com especialização em grandes aparelhos (aparelhos que não são comumente vistos nas escolas do país, como báscula, percha, trapézio de vôos, pêndulo, barra russa, maca russa, roda alemã, etc.). E pretende misturar professores brasileiros (que já têm destaque em suas atividades nas escolas locais) com professores estrangeiros, que seriam contratados para morar no país e fazer parte do projeto, suprindo inclusive carências já históricas: se não técnicas, no mínimo pedagógicas.

Este é o plano, o que estou escrevendo aqui não é oficial.

Tudo muito bonito e muito interessante. Mas aí fica evidente uma questão mais de fundo. São Paulo não tem um espaço de treinamento para o grande número de circenses que atuam por aqui, ou que passam por aqui. E, mais ainda, não tem espaço para a manutenção da técnica de todos esses alunos que se formam nas escolas que já existem ou que se formarão nas escolas que vêm por aí. As dificuldades encontradas pelos artistas os levam a improvisar e inventar inúmeros espaços na cidade, desde alugar galpões ou terrenos próprios que, por serem caros, têm que ser pequenos ou baixos; empréstimos de espaços em troca de trabalho (como a quadra de esportes da academia Competition, na Oscar freire, cuja atividade circense é conduzida pela Trupe Guezá, ou a academia Base, em Pinheiros, um restaurante, ou mesmo o Circo no Beco, com seus encontros e festivais, parte de um projeto social em Pinheiros); quintais das próprias casas dos circenses e espaços distantes do centro da Capital (a região de Cotia e Embú concentra grande parte dos circenses oriundos das primeiras escolas, com o Acrobática Fratelli, Circo Zanni, Circo Fractais, La Mínima e outros; e o ABC paulista também é área de grande atividade, e os mesmos problemas); e ocupação de espaços públicos, como o Pelezão, o Tendal da Lapa, o Parque do Ibirapuera, etc. sendo que nenhum é devidamente aparelhado para isso, e todos geram grandes problemas quanto ao seu funcionamento.

Com tudo isso, chego ao ponto. São Paulo precisa de um ou mais espaços, públicos e acessíveis, prioritariamente voltados para o treinamento e ensaio das técnicas circenses e montagem dos espetáculos e números dos profissionais. Sem isso, a categoria não evolui. Com um espaço de treinamento, os circenses convivem, trocam experiências, observam estilos diferentes, trocam técnicas, se ajudam, articulam, trocam informações, e crescem juntos. Isso faz o crescimento da categoria. E, como o mercado das grandes cidades não é mais itinerante, mas em grande parte fixo na cidade, esses locais de encontro e troca são fundamentais. Como era a Central do Circo, que existiu até 2004.

Não basta formar artistas (ou alunos). Há que existir ações que visem os profissionais. O artista se forma depois da formação na escola, como em qualquer área. E o mercado apenas absorve o que o artista tem pronto. Se não há espaço de treinamento ou montagem de números, o artista está engessado, e para de evoluir. Falarei mais disso na próxima coluna.

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