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Como a imprensa noticiou o final do Circo Garcia

Correio Popular – Campinas

07 de janeiro de 2003

Circo Garcia desce em definitivo suas lonas

Rogério Verzignasse

As cortinas do espetáculo se fecharam. Para sempre. Atolado em dívidas que chegam à casa dos R$ 800 mil, o Circo Garcia, o mais antigo do Brasil, encerrou as suas atividades. Fundada em Campinas, em 1928, a companhia circense chegou a figurar, na década de 70, entre as quatro maiores do mundo.

Seu fundador foi Antolim Garcia, paulistano, filho de imigrantes espanhóis, que conduziu o Circo Garcia ao sucesso no Exterior. O apogeu aconteceu entre 1954 e 1964, quando os espetáculos, com cinco lonas e cerca de 200 artistas contratados, viajaram por 72 países do mundo.

Desde a década de 80, o Garcia enfrentou crises financeiras sucessivas. A arte circense já encarava a concorrência da televisão, que passou a oferecer diversão sem que as pessoas precisassem sair de casa. Muitas lonas foram baixadas, no Brasil inteiro. Mas a instabilidade econômica atual foi decisiva.

A alta do dólar tornou inviável o pagamento de artistas internacionais, com remunerações atreladas à moeda norte-americana. O Garcia chegou a pagar US$ 2,7 mil por semana a trapezistas mexicanos. Quase toda a dívida atual é referente a salários atrasados.

Além disso, diversas leis passaram a proibir, em determinados municípios, a presença de animais no picadeiro. E, para o Garcia, não existem espetáculos sem animais. Era um dos únicos circos do mundo onde era realizada a procriação deles.

Mas alguns acontecimentos marcaram, de maneira particular, a derrocada do Garcia. Antolim morreu em 1987. Desde aquele ano, o grupo era administrado por sua mulher, Carola Boets, e pelo filho dele, Rolando Garcia, que faleceu em setembro do ano passado. “Sem meu enteado, fiquei muito sozinha”, afirma Carola. “Aqui nós estávamos empatando dinheiro”. Além de Rolando, morreram desde o 2000 os outros dois filhos de Antolim, Ruth e Romero.

A madrasta Carlota ficou desamparada. Hoje ela passa os dias olhando velhas fotografias e álbuns montados com recortes de jornais estrangeiros. São reportagens elogiosas ao circo. E, ao lado das pastas, fica o cinzeiro, lotado de bitucas de Carlton, que ela fuma sem parar.

A última apresentação

No dia 29 de dezembro, aconteceu o último espetáculo do Garcia, que estava montado na Avenida Guarapiranga, região do Santo Amaro, Zonal Sul paulistana. Sinal cruel dos tempos. Só 280 pessoas compareceram ao espetáculo, e se espalharam pela arquibancada construída para 3.500 espectadores. A arrecadação, lastima Carola, não foi suficiente nem para pagar os R$ 300,00 gastos com a manutenção dos geradores em uma noite de espetáculo.

Agora, todos os 50 artistas estão desempregados. Eles começam a deixar nesta terça o terreno da Avenida Guarapiranga, à procura de emprego em outras companhias. E daquela antiga trupe, com 200 artistas, só sobrou um estrangeiro: um mexicano, domador de tigres.

Outra preocupação da proprietária do espólio são os animais. Os 21 chimpanzés, segundo Carola, têm lugar para ficar, o sítio de uma amiga. Mas há quatro tigres e dois elefantes com o destino incerto.

Como os zoológicos estão lotados, e nenhum outro circo está disposto a investir em atrações cada dia mais dificultadas pelas leis, ela pensa em vendê-los para o Exterior. Seria uma forma, diz, de quitar algumas dívidas.

Seu patrimônio particular em nada lembra o verdadeiro império construído por Antolim. Desde a década de 80, quando a crise circense ficou mais séria, ela foi vendendo equipamentos e imóveis comprados pelo marido, com quem ela viveu durante 33 anos. Hoje ela só possui um apartamento em São Paulo.

Correio Popular – Campinas

09 de janeiro de 2003

Empresários tentam salvar Circo Garcia

Rogério Verzignasse

O Circo Garcia, o mais tradicional do Brasil, que baixou definitivamente suas lonas no final de dezembro, em São Paulo, recebe a ajuda financeira de empresários e artistas para quitar a dívida de R$ 800 mil que determinou o encerramento das atividades.

O empreendedor João Batista Sérgio Murad, conhecido no Brasil inteiro como Beto Carrero, dono de um dos maiores parques temáticos do mundo, no litoral catarinense, se dispôs, durante conversa pessoal com Carola Boets, a proprietária do espólio, a investir R$ 3,6 mil por mês para alimentar os animais remanescentes da trupe.

São chimpanzés, elefantes, tigres, cavalos e pôneis que permanecem nas jaulas do terreno da Avenida Guarapiranga, região de Santo Amaro (Zona Sul paulistana), onde aconteceu, no dia 29 do mês passado, o último espetáculo.

Os animais selvagens, diga-se passagem, têm destino incerto. Carola tenta vendê-los para companhias circenses internacionais, já que muitas leis municipais impedem a apresentação de circos com animais, no Brasil inteiro.

Ao receber as notícia do fechamento do Circo Garcia, Beto Carreira disse uma frase lacônica: “Quem sai perdendo com o fim do circo é a arte brasileira”, afirmou.

Rombo

Muitos outros empresários e artistas se dispuseram a ajudar no saneamento financeiro do grupo. Mas foram iniciativas individuais. As doações pequenas não serão suficiente para cobrir um rombo tão grande no caixa. Mesmo assim, Carola se sentiu emocionada com as manifestações de apoio que chegaram depois das reportagens veiculadas nesta semana por jornais e emissoras brasileiras de televisão.

Para apressar o pagamento de salários atrasados, ela vai colocar à venda o único bem que restou do império construído durante 74 anos por seu marido Antolim Garcia, fundador do circo, que morreu em 87. É um apartamento no bairro da Consolação.

É o encerramento de um processo gradativo de delapidação dos bens, iniciado no final da década de 80. Em pouco mais de uma década, após a morte de Antolim, Carola tomou iniciativas capazes de deixar embasbacado qualquer profissional do setor imobiliário.

Ela vendeu, por exemplo, um terreno no Centro da fluminense Petrópolis (um dos poucos que ainda não tinham sido ocupados por prédios naquele adensado trecho da cidade), por apenas R$ 13 mil. Depois vendeu por R$ 22 mil dois terrenos no condomínio fechado Caucaia do Alto, nas proximidades de Cotia (SP).

Tudo para ter recursos para quitar encargos trabalhistas que eram cobrados por ex-funcionários na Justiça.

Sem o apartamento para morar, que está sendo vendido, ela afirma resignada, com a voz emocionada: “O importante é pagar as dívidas. Eu posso passar o resto dos meus dias morando no trailler, junto com um chimpanzé”.

Humildade emocionante de uma senhora de 65 anos, que nasceu em uma família de músicos, na Bélgica, e que há 49 anos vivia no Circo Garcia. A companhia nasceu em Campinas em 1928 e, na década de 70, foi considerada uma das quatro maiores do mundo.

Correio Popular – Campinas

14 de janeiro de 2003

Artistas e animais do Circo Garcia têm novo destino

Rogério Verzignasse

O doloroso processo de desmanche do Circo Garcia, fundado em Campinas em 1928, e que encerrou suas atividades no dia 29 de dezembro, teve terça-feira um dia decisivo. A proprietária do espólio, Carola Boets, acertou a transferência dos quatro tigres para um santuário ecológico de Poços de Caldas (MG) e foi a intermediária da contratação de parte dos artistas remanescentes por outras companhias circenses.

Carola não vai receber um único tostão pelos tigres, que vão se transformar em atração daquela estância climática, visitada a cada ano por milhares de turistas brasileiros (cada um deles custa US$ 6 mil). Ainda assim, ela ficou satisfeita com o acordo. “Tenho a garantia de que eles serão bem tratados, terão uma sobrevivência digna”, disse.

Da mesma forma, ela vai transferir 21 chimpanzés para o sítio de uma amiga, a 30 quilômetros de São Paulo, por tempo indeterminado. Proprietária de diversos recintos onde são recolhidos animais de diversas espécies, a sitiante tem suas atividades fiscalizadas e aprovadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

E Carola e a amiga já firmaram um acordo importante. Caso ela (a proprietária do espólio) vier a falecer, a amiga estará herdando todos os animais. Para o imóvel rural também devem ser mandados, provisoriamente, outros animais mansos, como cavalos e pôneis.

Ela recebeu inúmeras propostas para a compra dos dois elefantes da trupe. Mas nenhum negócio foi fechado. As partes envolvidas nas discussões não chegaram a um acordo sobre preços. Cada elefante vale US$ 150 mil.

Ela recusou, também, as ofertas de empresários que queriam adquirir a marca “Circo Garcia” e mantê-lo em funcionamento. Mas Carola as rejeitou por uma questão moral. “Seria um desrespeito ao Antolim, que saiu do nada, e durante 74 anos montou uma das maiores companhias circenses do mundo”, afirma, se referindo ao ex-marido Antolim Garcia, filho de imigrantes espanhóis, fundador da trupe, quer morreu em 1987.

Artistas

Também foi acertada terça-feira a transferência de artistas (como malabaristas, bailarinas, domadores) para os circos Orlando Orfei, Thiani e Beto Pinheiro. Os trapezistas receberam a doação do trapézio, uma carreta acoplada a taillers (que servem de moradia), cabos de luz, geradores e até um caminhão Ford. O grupo vai montar um pequeno circo e continuar viajando.

As mesmas companhias ofereceram emprego para alguns trabalhadores braçais. Homens que instalam lonas e trabalham com os equipamentos elétricos e mecânicos. Gradativamente, ela comemora, as 50 pessoas que ainda permaneciam na trupe vão conseguindo colocação.

O Estado de São Paulo

09 de janeiro de 2003

Após 75 anos, Circo Garcia dá adeus à platéia.

Bárbara Souza

São Paulo – Depois de 75 anos de atividades no Brasil, o tradicional Circo Garcia começa a arriar a lona. Com ela, enrolam-se as histórias de famílias que nasceram nas estradas com o circo e viram, no dia 29 de dezembro, artistas como o palhaço Reco-Reco subir no picadeiro pela última vez. “Mesmo com tudo o que estou passando, viveria isso em outras dez vidas”, diz uma das donas do Garcia, Carola Boets, de 65 anos.

Uma dívida de quase R$ 1 milhão, dificuldades para encontrar terrenos no País e queda drástica de público seriam algumas das causas para o fim do Garcia. Mas o problema vem desde 1996. “Vivemos uma crise financeira terrível, provocada por uma recessão silenciosa que atingiu o Brasil inteiro”, diz Carola.

Desde o dia 29, aos poucos o terreno alugado na Estrada do M’Boi Mirim, no Campo Limpo, zona sul de São Paulo, vem se tornando uma grande clareira deserta. Restam alguns trailers dos poucos funcionários que insistem em esperar “por um milagre”, apesar de ouvirem Carola dizer que, mesmo que alguém a ajude a pagar as dívidas, ela não voltará a tocar o circo. “O dinheiro pode resolver o problema agora, mas, com a falta de apoio à arte no Brasil, daqui a dois anos vou sofrer tudo isso de novo”, diz.

A proprietária estima que 60 artistas continuem acompanhando a trupe. Nos tempos áureos, havia 380. Os anos 80 foram os melhores, segundo Carola. Em álbuns antigos, Carlos Drummond de Andrade, Ziraldo e Xuxa aparecem aplaudindo de pé as apresentações de circenses poloneses, russos, alemães e brasileiros. Entre os destaques, esteve também um corpo de bailado com 32 dançarinos.

O circo chegou a ser o quarto maior do mundo. Minguou a ponto de baixar o preço dos ingressos de R$ 15,00 – cobrados em 1995 – para R$ 10,00. “O que se vê hoje não é nem a sombra do que foi o Garcia”, lamenta Carola.

Há 29 anos, o apresentador Arisvaldo Rabelo, o Ari, abre o show. A voz de uma entonação inconfundível prepara a platéia para o que virá: elefantes, tigres, trapezistas, malabaristas, palhaços. “Criamos raízes aqui. De repente, vem um vendaval e tomba as árvores. Nos sentimos com as raízes para cima”, diz o locutor, que conheceu a mulher e teve três filhos no circo. Todos artistas.

Triste, Ari afirma que não perdeu as esperanças. Na última apresentação, que será fechada para o público e ocorre amanhã, ele não vai falar em despedida. “No lugar de adeus, vou me despedir como sempre fiz, dizendo apenas até o próximo espetáculo.”

O Estado de São Paulo – Cidades

12 de janeiro de 2003

Saudades do velho circo

Bárbara Souza e Moacir Assunção

Ao falar do último espetáculo do Garcia, que fecha por problemas financeiros, novos e antigos artistas admitem, com tristeza, que se trata do fim de uma era.

Bárbara Souza e Moacir Assunção

O empresário Beto Carrero resumiu sentimentos ao falar do fechamento do Circo Garcia, anunciado na semana passada, por problemas financeiros. “Estamos de luto.” O sentimento de perda é compartilhado pelos palhaços Waldemar Seyssel, o Arrelia, e Roger Avanzi, o Picolino, e se estende aos cerca de 60 funcionários. Perda por tantos anos e tantos feitos.

Grande parte dos 350 animais que deram início ao Parque Zoológico de São Paulo, em 1958, foi doada ou alugada pelo circo. No exterior, o Garcia, que viajou por 72 países, assumia o nome de Circo Brasil, para marcar a tradição circense do País, a exemplo do Cirque du Soleil, do Canadá, e do Circo de Moscou.

O tom de lamentação também virou tônica nas declarações do veterano palhaço Arrelia, hoje com 97 anos. Surdo, ele vive no Rio ao lado da mulher, Arlete, e considerou a perda irreparável. Arlete teve de “traduzir” suas palavras. O velho palhaço se expressa com dificuldade. “Os Garcias são uma das famílias mais tradicionais do circo. Lamento por todos que faziam aquele grande espetáculo e queria aproveitar para mandar um abraço afetuoso aos meus velhos companheiros, com a certeza de que ainda vão se reerguer”, disse o artista.

Emocionado, Picolino, de 80 anos, cuja mulher, Anita, é filha de Agenor Garcia, membro da família fundadora, quase não encontrou palavras para demonstrar a tristeza. “Gostaria de ainda ter forças para, mais uma vez, ajudar a levantar o Garcia. Na verdade, falta ajuda do governo para esse tipo de espetáculo, que encareceu muito para os empresários”, disse. A mulher, também de 80 anos, ficou doente com a perda do circo. Picolino trabalhou sete anos no circo, ao lado de Agenor, em uma época em que o espetáculo enfrentava grandes dificuldades, contornadas quando começou a fazer comédias.

Dono do Circo Di Napolli, o empresário Hugo Gelli, comparou a perda do Garcia a um crime contra a memória. “O circo é um patrimônio histórico nacional que não pode acabar.” No exterior, artistas também manifestaram tristeza pelo fechamento. Segundo Beto Carrero, amigos telefonaram para obter mais informações. O fim do Garcia, para o presidente da Associação Brasileira de Circo (Abac), José Wilson Moura Leite, representa o fim de uma era. “O circo tradicional parou no tempo, enquanto a versão moderna está em evidência”, explicou Leite, também diretor do Circo-Escola Picadeiro.

“Filhos”– Dona de duas elefantas – Rangun e Serva, ambas com 40 anos -, 23 chimpanzés e 4 tigres, a proprietária do Garcia, Carola Boets, de 65 anos, recebe as pessoas que visitam o circo apresentando o “bisneto”, o bebê chimpanzé Lucas, de 4 meses. “Não vou me desfazer deles. Como posso vender os meus filhos?” Carola deu continuidade ao trabalho depois da morte de Antolin Garcia, em 1983. Brasileiro de origem espanhola, que fundou o circo em 1928, ele deixou de ser alfaiate para seguir os passos da companhia do ator Benjamin de Oliveira.

Os animais ficarão no terreno alugado na Estrada do M’Boi Mirim, no Campo Limpo, zona sul, até que todos os funcionários comecem a trabalhar. “Os cavalos já foram doados para um haras. Mesmo com as críticas de entidades protetoras dos animais, ela se orgulha do contato com os chimpanzés. “Somos o único circo no mundo onde eles nascem criados em cativeiro. O primeiro veio nos anos 80 e já tem bisnetos.”

Ontem de manhã, um derradeiro espetáculo no circo foi feito espacialmente para um programa de televisão.

Hoje tem espetáculo?

Mauro Dias

Onde quer que arme sua lona, o circo é estrangeiro; daí a dificuldade de contar sua história, diz o palhaço contemporâneo Hugo Possolo, da trupe Parlapatões, Patifes & Paspalhões. Daí, dessa penumbra, desse mistério, também, por certo, um tanto de sua aura mítica e romanesca, seu inesgotável fascínio – se os grandes circos descem definitivamente a lona, não morre o palhaço.

Havia, funcionando só no interior do Estado de São Paulo, em 1998, mais de 400 pequenos circos, de acordo com levantamento feito pelo escritor Antônio Torres. Nascido no interior da Bahia, ele morou em frente do terreno onde, na cidadezinha, era montado o circo. Como qualquer menino que viveu experiência semelhante, apaixonou-se pela bailarina e quis fugir com a trupe.

Não o fez nem esqueceu a vontade. O circo aparece em vários de seus livros e, naquele 1998, por encomenda da Funarte, escreveu O Circo no Brasil, com muitas fotos, integrante da série História Visual, produzida pela fundação. Ali, conta que a do circo é a mais antiga e mais universal das artes. Grécia – O circo, como o conhecemos hoje, teria origem nos hipódromos da Grécia antiga e no império egípcio, onde e quando já se domavam animais. O cortejo de abertura celebrava a volta da guerra, os vencedores conduzindo os escravos; os animais exóticos provavam o quanto tinham ido longe os generais.

Boa quantidade dos clássicos números circenses saiu das olimpíadas – malabarismos em barras, argolas, por exemplo (o trapézio é bem recente e talvez seja prática nascida no circo). Tais artes tomaram corpo no Império Romano e em Pompéia. Ainda antes de Cristo, já havia um anfiteatro onde eram exibidas habilidades incomuns.

Em 366 a.C. surgiu o Circo Máximo, de Roma, que pegou fogo várias vezes e foi reconstruído tantas outras. Chegou a ter capacidade para abrigar 180 mil espectadores. Houve outros grandes espaços, na época. O Coliseu, inaugurado por Tito, na década de 90 d.C, tinha lugar para 90 mil pessoas (numa falha da pesquisa, Antônio Torres diz que o Coliseu foi construído sobre as ruínas do Circo Máximo, por Júlio César, na década de 40 a.C.).

No Coliseu exibiam-se animais exóticos, gladiadores, engolidores de fogo, malabaristas. Com Nero, vieram as práticas sangrentas e os artistas circenses foram para as praças públicas, agregando-se às feiras e dando início à vida mambembe. Foi nessa época que os artistas da baixa comédia passaram a integrar as trupes, marcando o nascimento do palhaço.

Mas o circo com picadeiro e ingressos pagos tem um inventor – o cavaleiro inglês Philip Astley, que montou a primeira estrutura na década de 1770.

Em poucos anos, outras capitais européias teriam circos fixos. Em 1830, um circo inglês atravessou o Atlântico em direção aos Estados Unidos e, na mesma época, Buenos Aires e Rio passaram a fazer parte da rota das companhias teatrais.

Mas, antes disso, o circo já era atividade nacional – em 1727, o bispo do Rio (cuja jurisdição estendia-se a Minas) pediu instruções ao Santo Ofício sobre como proceder com famílias ciganas que apresentavam espetáculos por ele considerados imorais, comédias e óperas, nas cercanias de Vila Rica do Ouro Preto.

No início dos anos 1800, fazia sucesso, em Minas, o ginasta, equilibrista, dançarino de corda e mestre-de-cerimônias Chiarini. O primeiro circo com lona e picadeiro foi o Bragassi, criado em 1830. Seguiram-se as companhias das família de Albano Pereira (portuguesa), Alexandre Lowande (norte-americana), Nelson (inglesa), Polidoro (portuguesa), Casali (argentina), François (francesa), Bozan (argentina), Temperini (italiana), Savala (peruana). Em 1887 e 1888, respectivamente, estabeleceram-se as famílias circenses dos japoneses Takaswa Mage e Franck Olimecha. Algumas delas ainda hoje estão na atividade. O palhaço Carequinha é da família Savala. Os Olimecha nos deram Gugu Olimecha, que, nos passos de Arrelia e Carequinha, levou a pantomima circense para a televisão. E o espetáculo continua.

Livro registrou 1 ano do Garcia

Se o livro Vida de Circo – Realidade e Fantasia fosse só mais um trabalho de conclusão de curso, talvez a fotógrafa Fernanda Prado, de 22 anos, não tivesse alcançado a nota máxima da banca examinadora do curso de jornalismo da Universidade Metodista, no fim de 2001. Entretanto, os professores tinham diante de si relatos fotográficos de uma história de amor entre a então universitária e o circo brasileiro.

Fernanda passou um ano acompanhando o trabalho do Circo Garcia. Das 1.100 imagens que captou, surgiu a proposta do livro, ainda não editado, por falta de patrocínio. “A idéia é fazer o mapeamento do circo brasileiro”, explicou.

O Estado de São Paulo

17 de janeiro de 2003

Projeto registra os últimos dias do Circo Garcia

Bárbara Souza

Jornalista acompanhou por um ano em viagens pelo País a rotina da trupe, que recém encerrou suas atividades. O resultado aguarda apoio para virar livro

São Paulo – A jornalista Fernanda Prado, de 22 anos, estava iniciando o trabalho de conclusão do curso de jornalismo da Universidade Metodista (Unimep) quando pisou pela primeira vez com sua Canon na arquibancada do Circo Garcia. Sua lona tradicional, sob a qual nasceram alguns dos melhores artistas circenses do País, foi desmontada no dia 29 de dezembro, por problemas financeiros, depois de 75 anos de atividades.

Intitulado Vida de Circo – Realidade e Fantasia, o trabalho universitário de Fernanda ganhava proporções maiores à medida que a então estudante se embrenhava nas apresentações da trupe, nos bastidores dos shows, nos camarins improvisados nos trailers que os artistas chamam de lar.

Para fazer o trabalho, a jornalista passou um ano acompanhando o grupo. Foi a todas as cidades por onde o circo passou em 2001. O suficiente para registrar 1.352 imagens em formato 35 milímetros.

“Fiquei tão encantada com aquilo que pensei em deixar tudo para ir embora com eles”, conta Fernanda, hoje lutando para publicar seu livro com as imagens da história de um circo inesquecível.

Uma obra que será bem-vinda para os amantes da arte circense. Pouco se tem documentado do Garcia, que chegou a ser o quarto maior circo do mundo, um dos mais imponentes do Brasil. Acabaram surgindo aí fotografias históricas para a cultura brasileira. Os registros fotográficos que marcam o último capítulo da obra seriam mais ou menos como um último capítulo da história do circo. “Essa parte do livro traz fotografias do circo indo embora, a lona no chão”, explica Fernanda.

São fotografias poéticas que retratam duas fases do dia-a-dia do Garcia: as feitas em filme preto-e-branco mostram a realidade do circo, os bastidores, o trabalho dos circenses; as coloridas contam um pouco do espetáculo, do show, da magia.

As imagens trazem detalhes do cotidiano circense – sob a visão de quem admira o circo desde a infância – aproveitando-se de vestígios de luz e sombras. A fotógrafa chegou a escalar a lona para fazer uma das imagens mais tocantes do trabalho: os palhaços deitados no picadeiro, exaustos depois de brincar e fazer rir na sua apresentação.

Agora, além de buscar patrocínio para publicar o livro, Fernanda tenta expandir o projeto para outros picadeiros. “A idéia é fazer um mapeamento do circo brasileiro, documentando outros trabalhos”, explica.

Ela reconhece, entretanto, a dificuldade para o projeto ganhar corpo. A fotógrafa busca há meses apoio para o projeto. “Conseguir um patrocínio para o livro é tão difícil quanto manter o circo de pé.” Contatos podem ser feitos pelo e-mail fernandabprado@uol.com.br ou pelo telefone (11) 9336-4521.

Folha de São Paulo

Revista da Folha

26 de janeiro de 2003

Circo Garcia

Até esta terça feira, os 2 elefantes, 4 tigres e 21 chipanzés do Circo Garcia, que encerrou as atividades no fim de dezembro do ano passado, após 74 anos de funcionamento, terão que mudar de endereço. Nessa data, encerra o prazo de contrato de locação do terreno onde estão os bichos, na zona sul de São Paulo. Segundo a proprietária, Carola Boets, 65, se não forem vendidos até essa data, os bichos serão encaminhados provisoriamente a criadores autorizados pelo Ibama.

Os preços, assim como os animais, não são para qualquer um: o valor pedido pelo elefante é US$ 150 mil, o de cada chimpanzé US$ 30 mil, um tigre US$ 6 mil.

“As negociações de venda dos bichos estão em andamento. Há interessados até nos Estados Unidos, mas o prazo de entrega do terreno termina depois de amanhã, e precisaremos desocupar o lugar”, diz Carola Boets.

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