O circo discutido no Cupula Circus Village Festival – 2024

O Instituto Nacional de Artes dos Circo (INAC), em Portugal, além de outras atividades pedagógicas e de criação, tem sido responsável pela programação do festival de circo “Cupula Circus Village Festival”, desde 2018. Este ano aconteceu a sua 6.ª edição, na vila de Arcozelo, no litoral norte de Portugal.

Na última década, em Portugal, tem vindo acontecer um fenómeno de crescimento de novos festivais de circo. O Cupula é um deles. Estes festivais pautam a sua programação sobretudo em artistas de circo com trabalho autoral no qual podemos enquadrar na linha daquilo a que se chama “circo contemporâneo” — com aspas propositadas.

Mesmo com a proliferação de novos artistas de circo, novos festivais e outras formas de programação e divulgação do circo, a escrita e discussão sobre circo em Portugal é ainda muito reduzida. Isabel Alves Costa abre o seu artigo “Artes do Circo” (Costa, 2005) escrevendo sobre a necessidade de se fomentar a escrita e publicação sistematizada sobre as artes do circo. Infelizmente esse trabalho praticamente terminou na segunda edição dos “Cadernos Rivoli” em 2004 e com este artigo de Isabel Alves Costa.

Passadas quase duas décadas, o INAC faz uma nova tentativa de incentivo à escrita e discussão do circo em Portugal. Começa por criar, em 2023, o RISCO — Centro de Investigação do Circo e, no mesmo ano, propõe dois momentos de reflexão sobre o circo na programação do Cúpula. No corrente ano, e novamente enquadrado na programação do festival, propõe dois novos momentos de discussão.

Num deles pude partilhar, em conjunto com Daniel de Carvalho Lopes, uma investigação que temos feito sobre as influências de portugueses no circo brasileiro e de brasileiros no circo português. Apesar de esta investigação ainda não estar terminada, e por termos já bastantes dados, decidimos partilhá-la publicamente numa palestra. Esta palestra não só permitiu a partilha da nossa investigação com o público, como foi possível, através de uma abertura ao diálogo como mesmo, partir para novas questões e modos de olhar a nossa parceria e investigação.

Atualmente preparamos a apresentação, no formato pôster, do resumo do nosso trabalho no 5.º Seminário Internacional de Circo promovido pelo Circus — FEF/UNICAMP, que irá acontecer em dezembro, deste ano, em Campinas (Brasil).

O segundo momento ficou marcado por uma provocação feita a vários artistas de circo em Portugal. Ao preparar esta mesa-redonda, eu e a direção do INAC sentimos uma necessidade de começar por colocar na mesma mesa pessoas ligadas a diferentes formas de fazer circo. Tivemos como convidados: Michele Chen, artista de circo da quarta geração da família Chen; Rodolfo Correia, artista de circo que se dedica ao circo social; Joana Martins, artista de circo e diretora da companhia Coração nas Mãos; e Juliana Moura, diretora pedagógica do INAC. A mesa-redonda intitulava-se de “Quantos circos cabem na tenda?”. Obviamente era uma provocação feita a todos os convidados, para que pudessem expor, numa sessão de frente a frente, as suas opiniões acerca do circo em Portugal e como estes vários elementos dialogam entre eles, ou não. Daniel de Carvalho Lopes também esteve presente nesta mesa para nos falar de como estas várias formas de fazer circo trabalham entre si no Brasil. O seu relato não só permitiu conhecer melhor a realidade do circo no Brasil, como foi inspirador para os membros que compunham a mesa-redonda.

A grande conclusão desta mesa foi a de que estamos longe de termos um diálogo entre os vários interlocutores. Essa falta de diálogo não tem nenhuma causa evidente identificada. Apenas não acontece. Ainda assim, sentiu-se, no final deste momento de reflexão, não só a necessidade, mas também a importância dialogarem mais e partilharem mais os seus conhecimentos e descobertas sobre o circo.

Apesar de o público nestes momentos de reflexão ser bastante reduzido, o mais importante destes dois momentos, foi compreender a necessidade da sistematização destes encontros, tal como Isabel Alves Costa afirmava há 19 anos. Em Portugal há várias frentes de trabalho ligadas ao circo, mas sinto que há falta o diálogo e partilha entres eles. Assim como há falta da escrita como forma de fixação de ideias passíveis de serem partilhadas e discutidas.

Rui Leitão . Outubro de 2024

Referências

Costa, I. A. (2005). As artes do circo. Sinais de Cena, 1(3), 49–56.

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