Em Ubatuba, muita gente conhece Cida Origuela, afinal, foram anos de dedicação a causas sociais na área da saúde e da assistência. Dentre as várias coisas que realizou, trabalhou na Santa Casa da cidade, onde seu foco foi a formação de uma equipe bem integrada que pudesse atender, com excelência, aos pacientes. Ao longo de vários anos, coordenou a Feira das Nações, evento tradicional que tem por meta angariar fundos de assistência a pessoas carentes.
O que poucos sabem é que essa visão de mundo onde a coletividade trabalha por um mesmo objetivo e onde se juntam muitas pequenas partes, para se atingir um todo grandioso, ela aprendeu nos tempos em que viveu no Circo: “No circo todos estão voltado prá uma coisa só: o espetáculo.”
Aos 14 anos (no início da década de 1960), morando no interior de Minas Gerais, conheceu Fernando, um rapaz que trabalhava num parque de diversões. O proprietário desse parque era irmão de Athaíde, dono de um pequeno circo que só se apresentava em cidades muito pequenas daquele Estado. Cida casou-se com Fernando e foram viver com o Circo Athaíde. “Lá aprendi de tudo, porque quem trabalha em Circo tem que saber fazer de tudo – se algum colega seu não pode entrar no picadeiro naquela noite, por qualquer motivo, você tem que entrar no lugar dele e fazer o número. Quando acabava o espetáculo e o púbico aplaudia, aquilo não tem dinheiro que pague.”
Começou bordando figurinos, aprendeu a jogar malabares, treinou e apresentou cachorrinhos que pulavam arcos, foi trapezista – “Naquele tempo era perigoso porque a gente treinava sem rede” -, participava do bailado e, também, entrou como palhaça, substituindo o titular. “Era um circo muito pequeno e pobre. A gente nem tinha trailer, morava em barracas e a cozinha era coletiva. Ainda tenho saudades do sabor da comida que a gente fazia usando latas de 20 litros, cheias de serragem, como fogão. Parece que a comida tinha outro gosto. Quando o caminhãozinho velho do circo chegava a alguma cidade, todo mundo olhava meio estranhado porque ainda existia muito preconceito, achavam que gente de circo era perigosa, que podia roubar as coisas das pessoas. Daí, quando o Circo estava quase montado, a gente saía pela cidade anunciando a estréia – que sempre era num sábado – com os pernas de pau na frente, com megafone, a gente com as roupas bordadas… o Circo ficava mais ou menos uns dois meses em cada cidade e, todas as noites, antes do espetáculo, a gente saía prá chamar o público.”
Além dos números de variedades e de animais (tinham um tigre e um elefante já bem velhos, à época), o Circo Athaíde também apresentava dramas e comédias (uma encenação por noite, com ponto para dar o texto aos atores) “Levávamos dois sucessos garantidos: O Ébrio e Coração de Mãe. Quando apresentávamos esses dramas, conseguíamos levantar dinheiro prá garantir a comida dos dias seguintes. Era uma vida muito sacrificada, mas maravilhosa porque a gente fazia as pessoas felizes. O tempo em que eu vivi no Circo serviu como preparação para a minha vida. Lá eu aprendi a ter amor pela coletividade e pelo trabalho.”
Quando estava com 17 anos, seu marido Fernando decidiu levar a vida de outra forma e o casal mudou-se para Taubaté, para trabalhar com comércio. Logo em seguida, aos 19, Cida ficou viúva e se mudou para Ubatuba. Foi aqui que conheceu João Origuela, com quem veio a se casar. A partir daí, sua vida a levou por diversos caminhos – morou na Itália, na Bélgica, conhece vários países, sempre vai aos Estados Unidos visitar uma filha que mora lá e aproveita para assistir ao Circo de Soleil. O contato que tem com o Circo é, apenas, como espectadora: “O Circo não tem idade. Toda vez que tem um circo, seja qual for, eu estou lá. Quando fui assistir a uma apresentação de Teatro da minha amiga Janaína, na Fundart, fiquei muito feliz em ver aquilo. Não sabia que era uma cena de palhaço (Dr. Redondo, dez/09), só soube na hora. Tive muitas saudades e uma inveja boa, uma vontade de estar lá. Se eu tivesse dinheiro, comprava uma lona, enchia de artistas e saia pelo mundo.”
Cida promete voltar às atividades circenses, neste ano de 2010, como aluna da Oficina de Circo da Fundart. Aluna é modo de dizer – temos certeza de que tem muito a ensinar.