Políticas Públicas para a Cultura – Uma Construção Gradual e Coletiva

“Aprende – Lê nos livros

Lê nos olhos – Aprende
A ler nos jornais, aprende
A verdade pensa
Com tua cabeça”

É tempo de semear sonhos, promover a esperança e consolidar diretrizes. Estamos novamente às vésperas de mais um pleito político, onde um manancial de idéias, propostas e projetos são apresentados num mosaico quase enigmático.

É preciso erguer o mastro e levantar a lona. Limpar o picadeiro e abrir a cortina. Um novo espetáculo vai começar. Velhos e novos artistas com seus números prodigiosos serão anunciados pelo mestre de cerimônia. Mas somos nós que iremos pagar o ingresso e bater palmas. Por isso é preciso primar pela qualidade técnica e artística das apresentações desses fazedores da arte política.

“Aponta o dedo, pergunta
O que é isso? Como foi?
Parar aí? Por que?
Você faz parte de tudo.”

A cultura se apresenta geralmente nos planos e propostas políticas de forma superficial e tendenciosa, refletindo uma falta de compromisso que gera ações desarticuladas, sazonais, a mercê do “gosto”, da “sensibilidade” e da “ideologia” dos governantes. A definição da política cultural em todas as esferas do poder executivo é necessária e urgente, devendo ser parte integrante e indissolúvel do desenvolvimento do estado. Como célula do total, ela requer uma definição conceitual mais precisa, a eleição de prioridades, e a elaboração de estratégias de ação.

A intervenção pública na cultura deve instigar o cidadão a realizar sua cidadania e participar ativamente da dinâmica social. Mais que realizar eventos culturais essa intervenção deve permitir aos cidadãos desenvolver suas próprias práticas culturais favorecendo a qualidade de vida. A definição clara e objetiva de uma política cultural permite o desenvolvimento de ações do poder público (ancorada em operações, princípios e procedimentos administrativos e orçamentários) que contribuem para a melhoria da qualidade de vida da população através de atividades culturais, artísticas, sociais, educacionais e recreativas para a sociedade como um todo e não para um de seus segmentos.

“Faça perguntas sem medo
Não te convenças sozinho
Mas veja com teus olhos
Se não descobriu por si
Na verdade não descobriu”

Dentro do universo da cadeia produtiva das artes cênicas no Brasil o Circo e a Ópera formam o conjunto de linguagens menos favorecidas pela intervenção sistemática do estado e, conseqüentemente, sem a provocação do estabelecimento de políticas específicas. Em diversos documentos oriundos de fóruns de discussões de política cultural pelo Brasil afora se quer a palavra circo aparece.

É tempo de aparar arestas, consolidar conquistas, reformular planos, fortalecer a organização do movimento e contribuir para a construção dessa política cultural. Nosso olhar deve quebrar as correntes do pensamento e liberar nosso espírito para a diversidade do circo brasileiro, respeitando e fortalecendo sua tradição e as diferenças regionais, mas integrando a arte circense à contemporaneidade da produção cênica nacional. É preciso pensar no profissional – formação (nos circos, nas escolas, nos projetos sociais), reconhecimento legal da atividade, garantia de espaço/mercado, criação de mecanismos legais facilitadores para o exercício da profissão e para a circulação dos circos, fortalecimento das trupes e circos, consolidação de processos de previdência, acesso aos direitos trabalhistas e sociais; é preciso pensar na arte em si – permanente aprimoramento técnico e artístico, diálogo com outras linguagens, promoção de pesquisa e registro historiográfico, troca de saberes, circulação de idéias e conceitos, manutenção da tradição e reinvenção de conceitos, valorização da experiência dos antigos e criação de espaços para os novos artistas; é preciso e necessário (mesmo que seja chato e enfadonho às vezes) criar mecanismos de diálogos permanentes entre os circenses, o poder público e a sociedade como um todo – fóruns, câmaras setoriais, comissões, colegiados, curadorias, conferências, encontros, seminários, redes. Mas do que nunca é preciso se manter unido. Isso não significa caminhar igual, mas caminhar juntos.

Um novo desenho de relação e tratamento com as manifestações culturais foi traçado nos últimos anos configurando antropologicamente a cultura, identificando, reconhecendo e respeitando as diferenças, construindo canais de diálogos e promovendo o fomento. Longe de ser o ideal essa “nova” configuração parece propor uma ordem que precisa ser avaliada e, como se diz em Pernambuco, futucada por todos nós, para que programas e ações de gestões possam ser aprimorados e transformados em políticas de estado consolidando a democracia cultural de cabo a rabo desse país.

“Aprende, não perde nada
Das discussões, do silêncio
Esteja sempre aprendendo
Por nós e por você”

Os princípios dessa democracia cultural são:

– Integração da política cultural ao processo de desenvolvimento (estimulamos o trabalho e, conseqüentemente a circulação financeira de forma direta e indireta);

– Respeito ao pluralismo e diversidade (precisamos garantir o espaço para a tradição e para os experimentos artísticos, para os circos itinerantes, trupes, grupos, escolas, projetos sociais, pesquisadores e artistas independentes);

– O Estado como incentivador, valorizador, fomentador e difusor das manifestações culturais (e não, como produtor);

– Descentralização das atividades (geograficamente, conceitualmente, esteticamente e economicamente);

– Integração cultural e social no cotidiano (somos um elo de uma corrente, não podemos ser tratados de forma isolada);

– Participação da sociedade – Princípio fundamental para a formulação dessa política cultural.

Nos próximos anos indubitavelmente acontecerá a implantação dos Sistemas de Cultura e, toda a sua estrutura funcional – Conselhos, Conferências e Fundos de Cultura. Teremos a aprovação das mudanças e consolidação da lei federal de incentivo à cultura, o surgimento e/ou aprimoramento de mecanismos estaduais e municipais de incentivo à cultura.

“Confere tudo, ponto
Por ponto – Afinal
Você faz parte de tudo
Também vai pagar o pato, vai
Pegar no leme um dia”

Mas é agora que temos que decidir e opinar sobre os caminhos que queremos e precisamos traçar, é o momento de assumirmos o nosso papel dentro desse espetáculo. O circo está lotado, algodão doce, pipoca, cachorro quente e refrigerantes já estão nas mãos do público, não dá mais pra recuar. Respeitável público o maior espetáculo da política brasileira vai começar!

“Você não será ouvinte
Diante da discussão
Não será cogumelo
De sombra e bastidores
Não será cenário
Para a nossa ação”

Poema “Precisamos de você”, de Bertolt Brecht

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