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Estudos a respeito da Pantomima a partir do espetáculo A Noite dos Palhaços Mudos, da Cia. La Mínima (pdf)

Resumo: O presente artigo aponta relações históricas e artísticas entre o espetáculo A Noite dos Palhaços Mudos (2008), da Cia. La Mínima, e estudos bibliográficos a respeito da linguagem cênica da pantomima em duas de suas manifestações: na Antiguidade greco-romana e nas pantomimas inglesas dos séculos XVIII e XIX.
Palavras-chave: Cia. La Mínima, A Noite dos Palhaços Mudos, pantomima, Palhaço.


Lilia Nemes Bastos (1)

A Noite dos Palhaços Mudos (2) (2008), da Cia. La Mínima, é um espetáculo cômico no qual a comunicação não verbal e a mistura de diversas habilidades artísticas – mímica, acrobacia, mágica, dança e música – dão suporte a uma trama fantástica: a busca empreendida por dois Palhaços Mudos (Domingos Montagner e Fernando Sampaio) pelo nariz vermelho de um deles, arrancado por um personagem empenhado em exterminá-los (Fábio Espósito, William Amaral ou Fernando Paz). A fala está presente no espetáculo de maneira pontual e como atributo exclusivo do exterminador. O predomínio do gesto como recurso de desenvolvimento da narrativa e o trânsito do espetáculo por diferentes expressões artísticas pode caracterizá-lo como herdeiro de processos históricos de produção de espetáculo baseados na pantomima e, também, como uma leitura atual desta linguagem.

Derivada dos termos gregos Pan, deus da natureza, e mimos, imitador, a palavra pantomima designa em sua origem um imitador da natureza (BROADBENT, 1901, p. 9), ou aquele que imita tudo (PAVIS, 2008, p. 274). Presente de maneiras distintas em diferentes culturas e momentos históricos, a pantomima tem longa tradição. Vamos tratar aqui de duas de suas expressões: a pantomima greco-romana e a pantomima inglesa, buscando traçar alguns paralelos com o espetáculo da Cia. La Mínima.

Segundo S. Montiglio, um dos mais antigos registros escritos a respeito da pantomima é grego e data do século IV a.C. Trata-se do texto O Banquete, de Xenofonte, discípulo de Sócrates, que descreve um garoto e uma garota representando por meio do gesto e da dança o tema mitológico do amor entre o deus Dioniso e Ariadne (MONTIGLIO, 1999, p. 264). O enredo da apresentação é introduzido pela fala de outro artista e a dança, de grande sensualidade, é acompanhada por um flautista.

Entre os gregos, o espetáculo da pantomima tinha o nome de orchésis ou cheironomía (quironomia), a arte de se exprimir com as mãos. O espetáculo envolvia uma ginástica acrobática, chamada cubistica, exercícios de destreza ou jogos com bola, denominados sferistica, e a orchestica, dança com diálogos e desenvolvimento de uma história (CAMARGO, 2006, p. 9). Dança e pantomima estavam intrinsecamente ligadas no mundo greco-romano, tornando-se sinônimos a partir da era de Augusto (27 a.C. – 14 d.C.) (MONTIGLIO, 1999, p. 264). De acordo com Magdeleine Cluzel, foi sob o reinado deste imperador que a pantomima de inspiração grega fez sua aparição em Roma, conhecendo uma voga crescente em todo o Império Romano e gradualmente ocupando o espaço do teatro trágico e cômico (CLUZEL, 1985, p. 40).

Inicialmente, muitos dançarinos gregos cantavam e dançavam ao mesmo tempo, mas a interferência do movimento na respiração (e consequentemente na voz) ensejou, em certos casos, uma divisão de funções entre dançarinos e cantores (MONTIGLIO, 1999, p. 265). Montiglio entende esta diferenciação como um traço característico do espetáculo da pantomima greco-romana, em contraste com a performance do mimo, artista que dançava, cantava, falava e tocava instrumentos em uma mesma apresentação (Idem, p. 264). Segundo Elaine Fantham, os mimos e mimas podiam ser bastante prestigiados na Roma Antiga, mas sua reputação não atingia o status dos homens dançarinos do espetáculo romano conhecido como pantomima, de alto custo e de temática predominantemente trágica (FANTHAM, 1989, p. 154). Broadbent também distingue mimos e pantomimos, caracterizando os primeiros como bufões com grandes habilidades mímicas e os segundos como atores trágicos, cujas performances normalmente silenciosas eram acompanhadas de música (BROADBENT, 1901, p. 40). Fantham entende o mimo como a vertente modesta do imponente espetáculo da pantomima romana, podendo ser apresentado na rua e em pequenas reuniões. Segundo a autora, os mimos e mimas falavam, dançavam e cantavam em meio ao público e ao barulho da rua (FANTHAM, 1989, p. 154-155).

Para os propósitos deste artigo, talvez possamos relativizar esta distinção entre mimos e pantomimos considerando que, muitas vezes, o discurso acerca da produção cultural reconstrói por meio da separação e/ou da hierarquização contextos marcados pelo intercâmbio de formas artísticas, sujeitos e espaços, cujas fronteiras não se estabelecem com nitidez. O acesso dos estudiosos a estes contextos está mediado pela disponibilidade e pela seleção das fontes, que permitem interpretações fragmentárias da complexidade cultural. A este respeito, Elaine Fantham problematiza a inadequação dos principais documentos disponíveis – textos literários e escolásticos para a compreensão de uma forma artística essencialmente livre e improvisada como o mimo (Ibidem, p. 153). Segundo Robson Corrêa de Camargo, o termo “pantomima” estendeu-se a todos os tipos de espetáculo romanos, assim como a palavra “mimo” foi utilizada para designar todo entretenimento oferecido no lugar teatral (CAMARGO, 2006, p. 2). Para o pesquisador, a pantomima, em suas diversas manifestações históricas, caracteriza-se como uma forma espetacular híbrida, marcada pelo acúmulo e entrecruzamento de diferentes formas artísticas, sem unidade genérica coerente (Ibidem, p. 6). Com base nestas considerações e na natureza exclusivamente bibliográfica da pesquisa que subsidia este artigo, vamos considerar “pantomima” e “mimo” como expressões intercambiáveis para formas artísticas greco-romanas, e “pantomimo” ou “mimo(a)” como sinônimos para seus intérpretes.

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Os palhaços mudos – Laerte

Artigo publicado na: Jornada de Pesquisa 2011. Programa de Pós Graduação em Artes – Mestrado e Doutorado Instituto de Artes UNESP. Comissão Organizadora Jornada 2011: Ana Araújo, Carlos Ataide Ferreira, Celso Amâncio de Melo Filho, Daniela Santos de Farias, Denise Pereira Rachel, Flávia Brassarola Borsani, Flávio Abuhab, Gabriela Caetano D’Amoreira, Juliana Ferreira Bernardo, Lilia Nemes Bastos, Milene Valentir Ugliara, organizadores. São Paulo: Instituto de Artes da UNESP, 2012. 

A Jornada de Pesquisa é um evento artístico-científico organizado pelos alunos do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Artes da Unesp com o intuito de fomentar a divulgação e o debate acerca das pesquisas desenvolvidas pelos pós-graduandos da Unesp e por outros pesquisadores. A partir de 2011, a Jornada de Pesquisa amplia suas ações ao criar uma publicação eletrônica vinculada ao evento. Nesta primeira edição, foram selecionados artigos das áreas de Artes Cênicas, Artes Visuais e Arte Educação. [texto completo]

 


(1) Mestranda em artes cênicas pelo Instituto de Artes da Universidade Paulista “Júlio de Mesquita Filho”/Unesp, sob orientação do Prof. Dr. Mario Fernando Bolognesi. Este artigo é fruto da pesquisa “A comicidade em A Noite dos Palhaços Mudos”, financiada pela FAPESP. E-mail da autora: lnemesbastos@gmail.com .
(2) O espetáculo é baseado na história em quadrinhos A Noite dos Palhaços Mudos, de Laerte Coutinho, disponível em: <http://www2.uol.com.br/laerte/personagens/palhacos/>. Acesso em: 13 dez. 2012. A direção do espetáculo é de Alvaro Assad, que assinou o roteiro junto com os integrantes da Cia. La Mínima, Domingos Montagner e Fernando Sampaio. A peça estreou em 2008 na cidade de São Paulo e tem sido apresentada em diversas cidades brasileiras.

 

 

 

 

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