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O tradicional circo familiar surge vivo em nova História

Beth Néspoli, jornalista do Estado de São Paulo, escreve artigo sobre o mais novo livro de Erminia Silva e Luis Alberto de Abreu.

capa_circoemcenaEditado pela Funarte, estudo de Erminia Silva desfaz equívocos sobre essa arte
Beth Néspoli

Por muitos motivos, O Auto do Circo é um desses espetáculos para se guardar na memória. Com texto de Luis Alberto de Abreu escrito especialmente para a Cia. Estável de Repertório, estreou no Teatro Flávio Império, em Cangaíba, em 2003. Mesclava humor e lirismo para narrar a saga de uma família circense e uma de suas principais qualidades estava em desfazer mitos e preconceitos ao abordar a trupe em seu treino diário, incluindo aí a formação das crianças, da arte ao ensino formal. A organização coletiva do trabalho não permitia analfabetos, isso numa época, década de 30 e 40, em que o desconhecimento da escrita era comum.

Pois acaba de ser lançado pela Funarte o livro Respeitável Público…O Circo em Cena, cuja leitura faz compreender a montagem como uma concentração de méritos. A matéria-prima trabalhada por Abreu foi a dissertação de mestrado de Erminia Silva. Agora, pesquisa e peça foram publicados pela Funarte. Lançado no Rio, onde Erminia dá aulas de História na Escola Nacional do Circo, ao preço especial de R$ 20,00, estima-se que custará R$ 35,00 e deve chegar às livrarias de São Paulo nos primeiros dias de janeiro.

Nascida numa família circense, Erminia Silva cursou História, concluiu mestrado e doutorado na Unicamp. Essa dupla aproximação, do circo pelos laços familiares e do rigor da pesquisa pela exigência do ensino formal, resulta num estudo profundo, sensível, mas também arguto, sem perda de senso crítico. Original, sua abordagem começa por desconstruir, criticamente, as historiografias realizadas nas décadas de 60 e 70 sobre o tema, mostrando que muitos equívocos sobre essa arte acabaram reforçados por teóricos dessa época. A confusão entre nomadismo e errância (o primeiro é opção e segue rota traçada previamente com objetivos definidos) ou entre saberes específicos transmitidos oralmente e a ausência deles são alguns dos mitos desfeitos com muita clareza de argumentos nessa pesquisa, cujo texto, retrabalhado pela autora, oferece leitura fluente e saborosa. O volume traz ainda reproduções de fotos do acervo familiar da autora e glossário de termos de técnicas circenses.

Ao dissecar a atividade em seus aspectos culturais, sua análise das transformações dessa arte não mais desenham um gráfico que vai do auge à decadência, como é comum na historiografia do circo. Surge a trama de uma rede interligada à Cultura de seu tempo, em constante adaptação, como ocorre com todo organismo vivo.


O Estado de São Paulo , 29.12.2009 – Caderno 2 – D3.


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